A experiência da cidade, como a vida, projecta-se sobre a dimensão subjectiva da nossa vivência. Este filtro de subjectividade é valioso porque sem ele seríamos incapazes de estabelecer um sentido de relevância das coisas, perdidos que ficaríamos em incontáveis observações indiferenciadas.
Assim, construímos sobre a nossa experiência do mundo uma relação afectiva. Como seres urbanos que somos, aprendemos a ler a cidade e a construir sobre ela referências daquilo que nos desperta sentido. Mas a cidade é um território crescentemente complexo, marcado pela ambiguidade e as muitas contingências que sobre ela actuam. E por esta dificuldade que nos atinge em compreendê-la, ignoramos tantas vezes aquilo que nela é disfuncional e difícil, onde falha a cidade.
A definição de vazios urbanos remete para esse espaço de ambiguidade. O vazio da cidade é, mais do que um vazio no sentido estrito, um fenómeno de falha. Falha de funções, de pessoas, de experiência estética, de diferença. Tratam-se assim de territórios de cisão entre a dimensão urbana, económica, jurídica e, inevitavelmente, social. Tornam-se espaços invisíveis, esquecidos pelos agentes da cidade e ignorados pelos seus habitantes. Olhar os vazios urbanos significa por isso redescobrir a cidade esquecida em todas as suas formas e projectar sobre ela uma intenção consciente, para resgatar as suas falhas e devolvê-las à vida, à cultura e ao que a transforma em cidade plena.
imagem: Benjamim Silva